“Seu bebê está com o cordão enrolado no pescoço.” Essa frase, dita durante um exame de ultrassom, costuma causar medo e insegurança em muitas gestantes. Na maioria das vezes, esse achado vem acompanhado de uma sugestão de agendamento de cesariana “por precaução”. Mas será que essa preocupação tem fundamento? A circular de cordão é mesmo um risco para o parto normal?
Neste artigo, vamos esclarecer os mitos e verdades sobre a circular de cordão, mostrar o que dizem as evidências científicas e explicar por que esse achado nem deveria ser relatado nos exames de imagem.
O que é circular de cordão?
A circular de cordão acontece quando o cordão umbilical dá uma ou mais voltas ao redor do pescoço do bebê. Isso pode parecer assustador, mas é uma condição extremamente comum: estima-se que ocorra em até 40% dos partos normais. Muitas vezes, o bebê nasce com uma ou mais voltas no pescoço sem qualquer consequência para sua saúde.
É importante entender que o cordão umbilical é longo, flexível e protegido por uma substância gelatinosa chamada geléia de Wharton, que amortece movimentos e evita compressões. O cordão foi feito para acompanhar os movimentos do bebê dentro do útero — e isso inclui o enrolar e desenrolar ao longo da gestação.
Por que a circular de cordão não é um risco para o parto normal
A ideia de que a circular de cordão representa risco iminente para o bebê é um mito comum, muitas vezes reforçado por profissionais que, sem respaldo em evidências científicas, indicam cesarianas desnecessárias.
Segundo especialistas em medicina fetal e obstetrícia, a circular de cordão isoladamente não causa sofrimento fetal e não deve ser usada como justificativa para uma cesárea eletiva.
Durante o trabalho de parto, é feito o monitoramento da frequência cardíaca do bebê. Se houver algum sinal de sofrimento fetal real, a equipe pode tomar decisões clínicas adequadas. Mas em mais de 95% dos casos, a circular de cordão não causa alteração nos batimentos e o nascimento ocorre de forma natural e segura.
Além disso, no momento da saída do bebê, o cordão pode ser facilmente desenrolado do pescoço pelo profissional de saúde — uma prática comum e segura.
Por que a circular de cordão nem deveria ser relatada no ultrassom
Um ponto fundamental abordado por alguns profissionais é que a circular de cordão não deveria ser mencionada nos laudos de ultrassonografia obstétrica de rotina, especialmente quando não há qualquer sinal de comprometimento fetal. Isso porque:
O achado é comum e transitório: o bebê pode se enrolar e desenrolar várias vezes ao longo da gestação.
O diagnóstico por imagem tem alta taxa de falsos positivos e não altera condutas clínicas.
Informar esse dado sem necessidade causa ansiedade desnecessária na gestante, levando-a a acreditar que há um risco grave onde, na realidade, não há.
Relatar esse tipo de achado pode ser interpretado como uma iatrogenia emocional — quando a informação médica, em vez de ajudar, provoca sofrimento e interfere nas escolhas da gestante, como optar por uma cesariana movida pelo medo.
Circular de cordão não é sentença de cesariana
É essencial que as gestantes recebam informações baseadas em evidências, e não em mitos perpetuados por conveniência ou desinformação. O diagnóstico de circular de cordão não representa risco por si só e não impede um parto normal seguro.
Partos vaginais com circular de cordão são comuns, seguros e amplamente documentados. Agendar uma cesariana com base apenas nesse achado é uma prática obsoleta, que não encontra respaldo em protocolos internacionais como os da OMS e da FEBRASGO.
Conclusão: Informação é o melhor cuidado
Se você recebeu a notícia de que seu bebê está com circular de cordão, saiba que isso não significa um risco iminente, e muito menos uma indicação automática de cesárea.
Converse com profissionais que respeitem a fisiologia do parto e estejam atualizados com as boas práticas baseadas em evidências. A circular de cordão é um fenômeno natural da gestação e, em condições normais, não deve ser motivo de alarme.
Seu parto pode e deve ser conduzido com segurança, tranquilidade e respeito às suas escolhas.
Referências:
Collins JH, et al. Umbilical cord accidents. Envolvimento do cordão umbilical e restrição do crescimento fetal. PubMed – PMID: 7566836
FetalMed. O Bebê está com o Cordão Enrolado no Pescoço? Não tem Problema! Disponível em: https://www.fetalmed.net/o-bebe-esta-com-o-cordao-enrolado-no-pescoco-nao-tem-problema
Clapp JF III. Nuchal cord and delivery outcome. Múltiplos emaranhados do cordão nucal e complicações intraparto. PubMed – PMID: 7485326
Schaffer L, et al. Nuchal cord and its implications. Resultado de bebês nascidos com cordões nucais. PubMed – PMID: 1556538